domingo, 18 de abril de 2010

O choro da tarde- por Pollyana Nobre




Não me perguntem por que amo Belém. Só posso responder que amo. Mesmo não gostando de muitas coisas nela.

Numa relação de amor e ódio vivemos. Xingo suas ruas, seu jeito de ser, sua personalidade persistente me tira do sério.E ela me devolve descontando todos os seus problemas do dia a dia, me encontrando em cada beco.Fico possessa, grito um “égua!” agoniado.Ela se desespera por vezes.Eu sei.É por isso que a amo.

Temos nossos momentos bons também. O meu sofrimento é por que ela não é só minha.

Belém é minha cortesã. A “Lucíola” do norte. Não aquela mortal de José de Alencar, mas é a minha imortal decadente.

Abraça a todos, oferece suas praças aos artistas sem dinheiro. Se abre aos pescadores e ribeirinhos em plena capital, deita-se com os sem tetos nos velhos monumentos (muitos deles respiram hoje apenas pó de reforma inacabada),oferece suas mangas nas valetas das avenidas entre os semáforos...Há gosto de mãe em Belém.Aquela resignada que tudo espera e que recebe pouco.Mas mãe é assim mesmo.

Lembrei de um poema de Max Martins: “Ver-O-peso”. Balança injusta essa nossa. Belém vale tão pouco , como todo o povo que a ama.Nossa grande feira nunca foi sinal de riqueza, a não ser riqueza cultural.Mas essa não ta valendo muito por aqui também não.Quem se lembra da nossa multiface?(Quem no Brasil faz idéia do que somos?)

Belém mãe e prostituta. Parece estranho adjetivá-la assim.Mas é isso mesmo.

Não fico triste pelo seu lado mãe, por acolher tanta gente que dela precisa.MAS PENSEM BEM, ela está sendo enganada por cada vagabundo.Vagabundos de classe, mas vagabundos.

Digo: “-Belém, não seja tão ingênua menina!”, “-Você tá saindo com quem não presta!”.

Minha cidade não sabe distinguir o que é melhor para ela, não sabe falar, não quer gritar. O meu amor está doente.Eu sinto.Respira abafadamente a tarde....de cansaço...de saudades do que não viu...As vezes um pouco animada balança as copas das mangueiras, mas o frescor é cada vez menor.Arde em febre no verão e chora.MELANCOLIA QUE ME ATRAVESSA.

Meus caros, a chuva da tarde não é chuva.É choro amargurado de quem não pode dizer não, de quem se dá a todos sem ter quem se doe a ela.

Minha doce prostituta está depressiva.

Minha mãe chora a cada dia um pouco mais.

Minha Belém morre afogada num socorro que ninguém escuta!

4 comentários:

  1. belo texto menina! texto de gente grande....

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  2. O sentimento é esse mesmo Polly, uma verve histórica que emociona misturada com detritos urbanos contemporâneos, gostei de sua escrita sem frescuras, como quem pisa no chão e sente a vida de verdade.

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  3. Lindo Polly, vc escreve muito bem! Poxa! adorei conhecer esse lado escritora. Parabens!

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